Legislação ambiental está mudando para defender o clima e o planeta
Enquanto os efeitos perigosos das mudanças climáticas continuam a piorar, os esforços legais para abordar uma série de questões ambientais também estão aumentando tanto ao nível local quanto global.
Manchetes no mundo todo divulgam muitas dessas ações legais: Lei climática da Coreia do Sul viola direitos de gerações futuras; Ucrânia é o marco zero na batalha pela lei do ecocídio; Paris quer conceder personalidade jurídica ao rio Sena; e Tribunal de Montana decide que crianças têm direito a um ambiente saudável, para citar alguns exemplos recentes.
Como advogada ambientalista, observo que a maioria desses processos utiliza uma das cinco estratégias jurídicas desenvolvidas nas últimas duas décadas. Essas abordagens variam em termos de quem move a ação, contra quem e se a perspectiva jurídica subjacente se baseia na proteção dos direitos humanos ou nos direitos do próprio meio ambiente. Mas todas compartilham uma abordagem inovadora para proteger toda a vida neste planeta.
1 – Direito a um ambiente saudável
Em 2022, as Nações Unidas declararam que os humanos têm “o direito a um ambiente limpo, saudável e sustentável… essencial para proteger a vida, o bem-estar e a dignidade humana”. Mais de 150 países têm declarações semelhantes em suas constituições ou leis, muitas vezes com proteções para outros direitos humanos, como os de educação e assistência médica.
Esses direitos são detidos por humanos, então as pessoas podem processar por supostas violações. Normalmente, elas processam uma ou mais agências governamentais, cuja responsabilidade é proteger os direitos humanos.
Um caso recente que utilizou essa abordagem foi o caso Held contra Montana, no qual um grupo de jovens, em 2024, venceu uma ação judicial contra o estado de Montana por violar o direito constitucional estadual a um “meio ambiente limpo e saudável”. A Suprema Corte estadual concordou com os autores e revogou uma lei que proibia a consideração dos efeitos climáticos na avaliação de propostas de extração de combustíveis fósseis. Casos semelhantes foram julgados nos EUA e em outros países ao redor do mundo.
O Tribunal Internacional de Justiça, o principal órgão judicial das Nações Unidas, decidiu em 23 de julho de 2025 que um “meio ambiente limpo, saudável e sustentável” é um direito humano. Também disse em uma decisão não vinculativa que os governos que não protegem as pessoas e o planeta das mudanças climáticas podem ser legalmente responsabilizados pelos danos resultantes.

Rikki Held, a autora principal no caso de Montana, sentada no centro, conversa com a equipe jurídica antes do início do julgamento em 12 de junho de 2023. (foto: William Campbell/Getty Images)
2 – Os direitos das gerações futuras
Um conceito jurídico denominado “equidade intergeracional” é a ideia de que as gerações presentes devem “usar e conservar os recursos naturais de forma responsável para o benefício das gerações futuras”. Codificado pela primeira vez no direito internacional na Declaração de Estocolmo de 1972, o princípio vem ganhando popularidade nas últimas décadas. Organizações internacionais e governos nacionais consagraram esse princípio em lei.
Com foco nos direitos humanos, essas leis permitem que pessoas e grupos apresentem ações, geralmente contra governos, por permitirem atividades que alteram o meio ambiente de forma a prejudicar as gerações futuras. Um caso bem conhecido que se baseou nesse princípio jurídico é o caso Gerações Futuras contra Ministério do Meio Ambiente e Outros, no qual um tribunal colombiano, em 2018, concordou com os jovens que haviam entrado com a ação, concluindo que a permissão do governo colombiano para o “desmatamento desenfreado na Amazônia “violava o pacto de equidade intergeracional.
3 – Responsabilidade do governo
Outra abordagem centrada no ser humano é a doutrina da confiança pública, que estabelece “que certos recursos naturais e culturais são preservados para uso público” e que os governos têm a responsabilidade de protegê-los para o benefício de todos.
Embora o conceito de “confiança pública” exista há muito tempo na lei, recentemente ele é usado para mover ações judiciais contra governos por sua falha em lidar com as mudanças climáticas e outras degradações ambientais. Em Urgenda Foundation contra the State of the Netherlands, um tribunal holandês decidiu em 2019 que o governo tem a responsabilidade de mitigar os efeitos das mudanças climáticas devido à “gravidade das consequências das mudanças climáticas e ao grande risco de ocorrência de mudanças climáticas”. Desde a decisão, o governo holandês tem buscado reduzir as emissões eliminando gradualmente o uso de carvão, aumentando a dependência de energia renovável e visando atingir a neutralidade de carbono até 2050.
A responsabilidade do governo pela confiança pública também foi a base do caso Juliana contra EUA, em que um grupo de jovens processou o governo dos EUA por violar a confiança pública ao não fazer o suficiente para reduzir as emissões de gases de efeito estufa. A Suprema Corte dos EUA acabou se recusando a ouvir um recurso da decisão de um tribunal inferior, mas a ausência de uma decisão específica da mais alta corte do país deu esperança contínua a novos casos, que continuam a ser movidos com base no mesmo princípio.
4 – Direitos da natureza
Os direitos da natureza são uma das estratégias jurídicas ambientais de crescimento mais rápido da última década. Desde que o Equador reconheceu os direitos da Pachamama, o nome quéchua para a Mãe Terra, em sua Constituição de 2008, mais de 500 leis sobre os direitos da natureza foram promulgadas em todo o mundo.
O princípio reconhece os direitos legais de entidades naturais, como rios, montanhas, ecossistemas ou mesmo algo tão específico como o arroz selvagem. As leis que garantem esses direitos não se concentram nos humanos, mas sim na própria natureza, incluindo frequentemente a linguagem de que a entidade natural tem o direito de “existir e persistir”.
As leis, então, fornecem um mecanismo para que a entidade natural — seja por meio de um grupo específico com tutela legal ou outros esforços comunitários — se proteja por meio de ações judiciais. No caso colombiano de 2018, o tribunal concluiu que o ecossistema amazônico possui direitos que devem ser respeitados e protegidos.
Da mesma forma, em Bangladesh, em 2019, os tribunais reconheceram os direitos de todos os rios do país, exigindo, entre outras medidas, a interrupção do desenvolvimento prejudicial ao longo dos rios que bloqueiam seu fluxo natural. O tribunal também criou uma comissão para atuar como guardiã legal dos rios do país.
E, em sua reunião global de outubro de 2025, a União Internacional para a Conservação da Natureza, um grupo que inclui mais de 160 governos nacionais e 1.400 outras organizações, apelou para que todas as nações reconheçam legalmente os direitos da natureza e, particularmente, dos rios.

A destruição de uma barragem na Ucrânia, que esvaziou este antigo reservatório, está sendo investigada como um possível crime de ecocídio. (foto: Tarasov / Ukrinform / Future Publishing / Getty Images)
5 – Definindo um novo crime: Ecocídio
Em 2024, os governos de Vanuatu, Fiji e Samoa propuseram formalmente que a comunidade internacional reconhecesse um novo crime sob o direito internacional. Denominado “ecocídio”, o princípio adota uma abordagem centrada na natureza e inclui qualquer ato ilícito cometido com “o conhecimento de que há uma probabilidade substancial de danos graves, generalizados ou de longo prazo ao meio ambiente”.
Em outras palavras, o que o genocídio representa para os humanos, o ecocídio representa para a natureza. Ele está sendo proposto como um acréscimo ao Estatuto de Roma de 2002, que criou o Tribunal Penal Internacional para julgar crimes de guerra, genocídio e crimes contra a humanidade. A União Internacional para a Conservação da Natureza (UICN) endossou essa proposta.
Embora a ideia seja relativamente nova, além dos esforços internacionais, vários países incorporaram o ecocídio em suas leis — incluindo Vietnã, França, Chile e Ucrânia. Um promotor ucraniano está investigando a destruição de uma barragem em junho de 2023 em uma área do país ocupada pela Rússia como um possível crime de ecocídio, devido às inundações generalizadas e à destruição de habitat resultantes.
A União Europeia também incorporou o ecocídio em sua Diretiva sobre Crimes Ambientais, que se aplica a todos os países-membros da UE, fornecendo a eles um mecanismo para ouvir reivindicações de ecocídio em seus tribunais nacionais.
Usando essas ideias
Cada um desses conceitos jurídicos tem o potencial de aumentar a proteção do meio ambiente — e das pessoas que nele vivem. Mas determinar qual estratégia tem maior chance de sucesso depende dos detalhes da legislação e do sistema jurídico vigentes em cada comunidade.
Todas essas estratégias legais têm um papel na luta para proteger e preservar o meio ambiente como um ser vivo integral e interdependente que é de vital importância para nós como humanos, mas também por si só.
Fonte: com informações da advogada ambientalista Dana Zartner para o The Conversation.
Dana Zartner, JD, PhD, professora da Faculdade de Direito da Universidade de São Francisco, onde se especializou em direito internacional e comparado, com foco na intersecção entre justiça ambiental e direitos humanos.






